Profissões ligadas ao áudio 3 – o Sonoplasta

Imagine um artista plástico. Dê a ele o material certo e de suas mãos sairá uma obra de arte. Existem artistas que usam argila, papel, tintas, ferragens, plástico e até mesmo sucata e lixo. Onde as pessoas vêem apenas o material bruto, o artista vê arte (se alguém vai comprar a "arte" depois, isso é outra história). O material é o meio do artista extravasar sua criatividade. Aliás, o que conta para o artista plástico é a criatividade pessoal de cada um.

Existe um profissional de áudio que não é músico, mas trabalha diretamente com a criatividade. É o sonoplasta. Apesar de muita gente chamar indiscrimadamente qualquer um que trabalha com áudio de sonoplasta (em igrejas principalmente, e inclusive eu fiz isso em alguns dos artigos do SomAoVivo, mas já estou me corrigindo), na verdade o sonoplasta é um artista plástico que trabalha com sons.

A sonoplastia "nasceu" e "cresceu" junto com o rádio. Antigamente existiam as rádio-novelas e a necessidade de se colocar efeitos sonoros. Na cena tem um trote de cavalo? Então o sonoplasta tinha que dar um jeito de conseguir gravar o som do trotar de cavalo ou então simular esse som.

Antigamente muito do trabalho do sonoplasta era simulações de som. Barulho de fogo? Papel celofane amassado.  Os sonoplastas antigos faziam sons com papel, areia, papelão, até com pente de cabelo se fazia efeitos. Atualmente, existem bancos de sons, sites com inúmeros sons já prontos, pré-gravados, e o sonoplasta "apenas" terá o trabalho de tocá-los no momento certo. Um dos maiores do Brasil é o banco de sons da Publinter (www.publinter.com.br) com mais de 50.000 efeitos sonoros e sons diferentes. Obviamente o serviço é pago.

As rádios ainda mantém sonoplastas, mas com o advento da televisão o campo de trabalho se tornou muito grande. São esses os profissionais que, a partir das imagens de um filme, um programa qualquer ou documentário (as "matérias), montam  o áudio que irá acompanhar essas imagens. É o sonoplasta que encaixa a trilha sonora de acordo com o que está sendo transmitido: uma música triste para momentos dramáticos, uma música alegre para momentos festivos, e assim por diante. Um bom tema musical pode enriquecer uma matéria, como uma má escolha como pode derrubá-la. As músicas incidentais fazem o clima crescer, levando o espectador a ficar tenso, aliviado, feliz ou bravo de acordo com o roteiro da cena que ele está vendo.

As músicas utilizadas pelo sonoplasta não são dele, mas de outros artistas. O sonoplasta não é músico nem compositor. Exatamente por esse motivo, o sonoplasta é aquela pessoa que ouve de tudo (de tudo mesmo: baião, samba, rock pesado), e conhece decorado todas as letras de música. Ouvir de tudo é mais que necessidade: imagine uma reportagem sobre a Feira de Caruaru, no sertão de Pernambuco. Que música ele vai colocar? Um rock não dá… 

Atuar em rádio, TV e cinema, onde os programas são pré-gravados (e editados, e consertados…antes de ir ao ar) é relativamente fácil. Mas o sonoplasta também trabalha em apresentações ao vivo (programas de auditório, teatros, etc) e tem um duro trabalho pela frente. Se tudo der certo, ninguém vai nem lembrar que ele existe. Se der errado, pode levar à apresentação ao fracasso. Para exemplificar, vou citar um texto que encontrei em: http://www.pr.gov.br/batebyte/edicoes/2000/bb101/flagrantes.htm

"Numa das primeiras cenas um dos atores deveria identificar-se como o manda-chuva do pedaço e para isso, deveria encher os pulmões de ar e elevar os ombros, franzir a testa, cerrar os lábios e no momento em que soltaria o ar, o som do rugido de um leão acompanharia a sonoplastia para convencer da sua superioridade. O ator até que fez tudo direitinho, só que não imaginava que em vez do rugido do leão ouviria a campainha de um telefone. Bom de improviso, o ator não teve dúvida, na tentativa de não deixar o público perceber a falha da sonoplastia, corre para o telefone e no momento em que ele leva a mão para atendê-lo, o telefone ruge como uma fera para ele como se fosse o rei da selva. Rebuscando no fundo do baú e continuando o improviso, o ator diz:

– Acho que não vou atender, deve ser do imposto de renda.

Outra cena: mãe e filha começam uma discussão em segundo plano. Ao fundo deveria haver o som de diversas galinhas cacarejando. No momento certo, eis que se ouve o barulho de copos quebrando!! Já dá para imaginar o som que apareceu quando o mordomo derrubou a bandeja de copos, não??

Na cena da discussão entre pai e filha, era para correr algo bem do tipo "novela mexicana", assim que entrasse a música que havia sido escolhida para dar mais "dramaticidade" ao momento. Só que a música levou 45 segundos para começar e lá estavam os atores em cena, parados como estátua, esperando a sonoplastia…"

Em televisão os programas ao vivo também exigem a presença do sonoplasta, desta vez como um misto de operador-de-som-DJ-sonoplasta. O sonoplasta opera a mesa (um programa de entrevistas, por exemplo), também da uma de DJ (programas de auditório, Faustão, por exemplo) e opera a mesa, coloca as músicas e os efeitos especiais (um programa de comédia, o Show do Tom, a Turma do Didi, etc). E não pense que a vida é simples não: alguns programas tem até 4 mesas de mixagem, vários sonoplastas ou um sonoplasta e vários operadores.

E porque o sonoplasta é um profissional de áudio? Seu trabalho envolve muito de sons, muito de música e muito de áudio. Um sonoplasta precisa conhecer muito bem microfones e técnicas de gravação, para poder montar seu próprio banco de sons. Nesse ramo, a originalidade é muito apreciada, e um sonoplasta é mais bem visto quanto mais original ele for. Ainda existem sonoplastas que vão buscar seus sons em campo.

Mas ele também precisa conhecer operação de mesas de som, amplificação, acústica. Em eventos ao vivo, o sonoplasta trabalha ao lado do peazeiro ou até mesmo acumula suas funções. Um sonoplasta não vai fazer um grande show ao vivo, mas em um teatro ele irá enriquecer a apresentação dos atores, enquanto no mesmo teatro o peazeiro não faria mais que a microfonação. Podemos concluir que o sonoplasta é um misto de peazeiro com DJ.

Na revisão do texto, o Ingo pediu para colocar não só os maus exemplos de sonoplastia, mas também os bons. Pedi a ele nomes de programas, e ele falou com muita propriedade: "você não assiste televisão não? Tudo é bom exemplo, raros são os maus exemplos, que acontecem mais nos eventos ao vivo, até pela dificuldade da situação". É verdade. Quase todo programa de TV tem um fundo musical, um efeito sonoro, o "dedo" do sonoplasta. Infelizmente nos acostumamos com os bons exemplos e perdemos a capacidade de elogiá-los. Achamos que é "normal", e esquecemos o enorme trabalho de quem está por trás das câmeras, cujos nomes aparecem rapidamente, nos créditos. Mas é só apertar a tecla Mute do controle remoto para saber que falta que esse trabalho faz!

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Revisado por Ingo von Ledebur, sonoplasta (mesmo) de uma rede de televisão de alcance nacional.  
 

Revisado em 13/Mar/2008

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