Cabeçotes, pequenas maravilhas

Alguns anos atrás, cabeçote era sinônimo de caixa amplificada sem os falantes. Um misto de “mixer com amplificador”. Poucos canais, poucos recursos (em geral, controle de volume individual e equalização única para todos os canais) e pouca potência. Sua grande vantagem em cima de caixa amplificada é permitir o uso de duas ou mais caixas acústicas e a portabilidade (são bem compactos, fáceis de carregar), mas além disso não há nada que nos atraia para esse tipo de equipamento.

Esse tipo de cabeçote ainda é fabricado por algumas empresas brasileiras e até mesmo estrangeiras. São úteis para situações que não exigem muita qualidade, como uma pequena festinha, um churrasco, uma reunião de amigos, etc. Usos em que recursos mais aprimorados não são necessários, usos em que a “qualidade” da sonorização não é muito levada em conta.

Para o uso em igrejas, seriam provavelmente a última opção de escolha para quem tem coisa melhor disponível, a não ser naquelas realmente pequenas. Se já temos tanta dificuldade em conter as microfonias quando temos controles de graves, médios e agudos por canal, quanto mais em um aparelho que tem controles gerais, que afetam todos os canais.

Mas existe uma nova geração de cabeçotes, que já tem recursos equivalentes aos das mesas de som, e não ficam nada a dever quanto a sonoridade (usam os mesmos prés que as mesas de som das marcas). Equalização por canal, Phantom Power, entradas balanceadas, até mesmo mesmo efeitos e equalizadores integrados. E ainda esbanjam potências – alguns já tem mais de 1.000 Watts RMS. Os amplificadores podem ser utilizados em duas configurações (ambos os canais para PA ou um canal para PA e outro para retorno – monitor – dos músicos). Enfim, praticamente tudo que qualquer um precisa para fazer um som de qualidade. É equipamento para qualquer operador de som “babar” em cima, e eu tive a oportunidade de fazer isso.

Assim, enquanto minha esposa passeava em um shopping center (pela primeira vez falei com ela para demorar o quanto quisesse), encontrei em uma loja 3 cabeçotes dessa nova leva, todos de boas marcas. Como era uma segunda feira de manhã e o vendedor estava com muita paciência (e a loja vazia), tive 2 horas para testar essas belezinhas.

Vejamos os nossos “concorrentes”:

Alto PBM8.500 MK II

Com 55cm de largura por 31cm altura por 22cm de profundidade, este Alto nos lembrou que portabilidade não é sinônimo de leveza. São 15kg, mas não é para menos: são 500 W RMS/canal em 4 Ohms (1.000 Watts totais)!!! Com essa potência, ele pode ser pesado o quanto quiser (aliás, tem muito amplificador com menos potência e mais peso que esse cabeçote).

Temos 8 canais com recursos bastante completos, a saber (de baixo para cima):

– Entradas XLR (para microfones) e LINE IN (P10 TRS). Os canais 7 e 8 tem entradas LINE IN estéreos (2 x P10).
– o controle de volume, para ganhar espaço, é rotativo. Mas a Alto teve cuidado de colocar este botão mais “gordinho” que os outros, de forma a facilitar o uso.
– controle de PAN
– controle de Aux Pós (para efeito)
– controle de Aux Pré
– equalização de 3 vias, com +/- 15dB em graves (80Hz), médios (2,5KHz) e agudos (12KHz)

Há ainda um botão com utilização bastante interessante, que é o PAD (-20dB). Ao se pressionar esse botão, atenuamos o sinal de entrada em -20dB. É útil para sinais de entrada muito altos, como por exemplo quando ligamos um instrumento na entrada XLR (quando o Direct Box não possui atenuação). Como sou fã do recurso de MUTE e senti falta dele neste cabeçote, descobri que esse botão pode funcionar como o recurso. O som não é totalmente cortado, mas a atenuação é bem forte e ajuda muito.

Já na seção master, o destaque fica para os dois equalizadores de 9 faixas, um para as saídas Masters (afeta tanto L quanto R) e outro para a saída de Monitor. Ambos os equalizadores são dotados de um recurso chamado “Feedback Terminator” (também muito comum em produtos da Behringer), em que leds “piscam” conforme as frequências mais utilizadas na música. Assim, quando acontecer uma microfonia, a frequência será destacada (o led vai acender mais que os outros) visualmente e dando a chance ao operar atenuá-la, diminuindo a chance de ocorrer novas microfonias nessa frequência.

O efeito interno é muito interessante, com 16 “presets” (tipos de efeitos), cada um com 16 variações. Mesmo sem mais controles, com certeza em 256 variações totais encontraremos um efeito adequado para cada tipo de uso. Ainda assim, quem não quiser usar o efeito interno pode usar um módulo externo, pois há os conectores para isso (Out e Return).

Um detalhe sobre as saídas de som: são em conectores Speakon. Pode-se usar modo Bridge, mas será necessário ainda utilizar os dois conectores, montando uma pequena “gambiarra” para o uso nesse modo. Dois conectores macho Speakon alimentariam um conector fêmea Speakon. Desse conector fêmea que as caixas seriam alimentadas.

Este cabeçote da Alto existe em duas versões, o PBM8.500 e o PBM8.250 (com metade da potência do “irmão maior”). O preço do PBM 8.500 é de incríveis R$ 2.200,00, muito caro se pensarmos em “apenas 8 canais”, pouco se pensarmos que são 1.000 Watts de potência.

Yamaha EMX 312SC

Com 44cm de largura por 28 de altura por 26 de profundidade, este cabeçote Yamaha é bem mais fácil de transportar que o do Alto. E são apenas 9Kg, mesmo peso nas três versões (212S, 300W RMS, 312SC, 450W RMS e 512SC, 500W RMS).

Também apresentam 8 canais, com recursos bastante semelhantes aos cabeçotes da Alto. Dos 8 canais, todos aceitam microfones, 2 deles aceitam entradas LINE IN com conectores P10 estéreo e dois tem entradas LINE com conectores RCA, aceitando conexões com DVD Player, MP3, etc.

Em relação ao produto da Alto, a novidade fica na existência de luzes indicativas de pico em todos os canais (sempre bem vindas). Ao lado das luzes, as enigmáticas letras FCL. Segundo o manual, FCL quer dizer “Feedback Channel Locating”, algo como “Localizar de Canal com Microfonia”. Se o nível de um canal exceder um valor (como em uma microfonia, etc), a luz acende. Apesar do nome diferente, nada mais que uma luz de pico! Mas é um recurso sempre bem vindo.

Outra novidade é a existência de compressores nos canais 1 a 4. Este compressor é o mais simples possível, sem ajuste algum de Attack, Release, Threshold nem nada, devendo ser regulado mesmo “de ouvido”. As passagens da música com volume mais forte são atenuadas e as passagens com volume mais suave são incrementadas – apenas isso. Não substitui um compressor de verdade mas – como vem “de graça”, é um bom incremento ao aparelho. Principalmente pelo fato de nenhum desses cabeçotes contar com entradas Insert nos canais. O modelo EMX 212 não conta com esse recurso.

Nos 4 primeiros canais também há um curioso botão para selecionar se a entrada é de MIC ou LINE. Curioso porque, em havendo duas entradas diferentes, é padrão o conector XLR ser para MIC e o conector P10 ser para LINE. A existência dessa chave nos permite conectar um microfone com cabo P10 (muito comum em sistemas de baixo custo) e selecionar a posição correta, o que é bom, ou mesmo conectar um instrumento e selecionar MIC, o que é ruim, muito ruim (pode até queimar o canal).

Não há controle de PAN. A Yamaha deve imaginar que, na maioria das vezes, o amplificador interno é que será utilizado, e principalmente na posição PA mais monitor, caso em que o controle de PAN realmente seria inútil (as saídas tanto de PA quanto  monitor seriam sempre mono). Não devem estar errados.

A Yamaha sempre fez bons módulos de efeito, e o módulo deste cabeçote não foge à regra. São 16 “presets”, alguns voltados para voz, outros para instrumentos. O resultado é bem agradável, mas o cabeçote da Alto deu show nesse ponto aqui. Em não querendo usar o módulo interno, há saída para alimentar um módulo externo, mas o retorno do som processado deve ser feito por um dos canais.

Os equalizadores são de 7 faixas, menos que nos outros dois aparelhos, ambos com 9 faixas. Mas funciona bem.

Há dois led´s vermelhos com a indicação “Limiter”. Saí da loja com a impressão de que este aparelho conta até com limitares internos, coisa excelente. Mas uma consulta ao manual em casa, pela internet, mostrou que são apenas luzes de pico, indicativas de que o nível máximo foi alcançado.

Em compensação, as saídas de caixa de som desse Yamaha são melhores. Não há modo Bridge, e os conectores Speakon estão lá, mas há também P10, tão comuns no Brasil. Isso melhora a versatilidade do equipamento, pois aqui no Brasil Speakon é bem mais raro (e caro) que os P10.

Uma coisa muito legal nesse Yamaha é que ele pode ser utilizado na vertical ou em ângulo (algo como 70º), o que facilita muito o seu uso por alguém sentado.

Este cabeçote Yamaha custa na loja R$ 1.700,00.

Behringer PMH-2000

Com 46cm de largura por 28 de altura, por 27 de profundidade e pesando 15kg, esse aparelho é do tamanho do cabeçote da Yamaha e do peso do cabeçote da Alto. Conta com 500 Watts de potência.

Esse foi o mixer com mais canais, 10, apresentando 9 canais com entradas para microfone, sendo que três deles aceitam entradas LINE estéreo, e o décimo canal só tem entrada LINE, com conector RCA. A Behringer aproveitou o espaço sobrando e colocou saídas LINE OUT para gravação, com conectores RCA, bem próximos. Isso pode gerar alguma confusão (é necessário prestar atenção para saber qual o conector é IN e qual é OUT). Os outros fabricantes deixaram os conectores LINE OUT longe, na seção master.

Os canais 1 a 6 são dotados de luz indicativa de pico e chave PAD com atenuação de -25dB (um “MUTE” melhor que o da Alto). Contam também com um filtro passa-altas (chamado de Rumble Filter), mas que fica lá na seção de master, em um controle único para todos os canais. E não dá para saber até qual frequência é feita a atenuação (se 80 ou 100Hz, por exemplo).

O módulo de efeitos deste Behringer é o mais fraco de todos. Não há muita coisa aproveitável para voz, a ênfase é nos efeitos para instrumentos musicais. Mas o maior problema é que não existe nenhuma forma de ligar um módulo externo.

Em todos os mixers, caso necessitemos de mais potência que os amplificadores internos podem suprir, há saídas (MAIN OUT, MONITOR OUT) para ligarmos amplificadores externos. No Behringer, uma interessante surpresa: além dessas saídas, há entradas (POWER AMP INPUTS)! Se tivermos uma mesa de som melhor, podemos utilizar o PHM-2000 apenas como amplificador, desprezando os canais do cabeçote. Recurso legal.

Os equalizadores são de 9 faixas, como no produto da Alto. Este foi o único cabeçote que trouxe uma chave de acionamento do equalizador (EQ IN), o que é bem interessante, permitindo uma rápida comparação do som com e sem equalização.

Quanto as saídas, são Speakon e existe um terceiro conector para o modo bridge. A Alto poderia aprender com a Behringer nesse ponto… e as duas poderiam aprender com a Yamaha.

Este cabeçote custa na loja R$ 1.500,00.

Impressões no teste

Eu gosto de fazer testes de equipamentos entre aqueles que realmente eu pude usar em alguns eventos, com bastante coisa, para ver o comportamente. Eu tive duas horas em uma sala pequena, sem poder fazer muito “barulho”, e apenas eu, o vendedor e um microfone. Logo, não é o teste mais confiável do mundo. Mas melhor que nada.

Dos produtos, o Alto foi o que mais me chamou a atenção. Há vários pontos muitos legais nele. Mixers compactos (cabeçotes ou não) sempre demandam bastante cuidado na hora de mexer nos botões para não esbarrar nos outros laterias. Nesse equipamento não há esse problema. Há um dedo de folga entre um canal e outro e o risco de esbarrar é quase nulo. Por outro lado, isso sacrifica a portabilidade.

Também fiquei impressionado com o seu equalizador: qualquer pequena mexida já causa uma diferença perceptível no som (lembrou-me o equalizador da Mackie CFX-20). A qualidade de som não fica absolutamente nada à dever quando comparado com outras mesas da marca. O som é claro e limpo. Mas em absoluto é o pior dos três modelos para carregar.

A mesa da Yamaha, por outro lado, é a mais fácil de carregar. Os compressores nos canais 1 a 4 atuaram bem, “achatando” a dinâmica da voz do vendedor. O equalizador de 7 faixas dá menos controle que o dos concorrentes, mas ainda assim funciona bem. Os efeitos internos são simples mas muito bons, adequados ao tipo de uso ao qual o equipamento se destina. E quando o vendedor colocou o aparelho um pouco “tombado”, tornando seu uso bem mais prático, foi excelente.

Quanto ao Behringer, mais canais são sempre bem vindos. Como já conheço os efeitos internos (da Berhringer SL2442FX-Pro), senti muita falta da possibilidade de uso de um módulo externo. Mas o que realmente não gostei nesse cabeçote foram os equalizadores. Tem que mexer muito no potenciômetro para sentir alterações no som. Bem diferente do equalizador da Alto, e inferior ao da Yamaha também.

Uso de cabeçotes em igrejas

Eu não trocaria, em uma igreja, o uso de um conjunto amplificares + periféricos + mesa por um cabeçote. Não é por causa da quantidade de canais, nem de falta de recursos (os cabeçotes não ficam nada à dever). A diferença fica principalmente na mesa de som, pela facilidade de uso de utilizá-la na horizontal, com todos os recursos muito mais à mão. Ficamos muito mais confortáveis para operar uma mesa assim.

Já um cabeçote, na vertical, foi feito para operarmos ou em pé ou fazendo algum tipo de adaptação em um móvel para deixá-lo inclinado. Operá-lo em cima de uma mesa com o técnico sentado nos obriga o tempo todo abaixar para saber se estamos mexendo no lugar certo (tirando o Alto, os outros são bem “apertados”), e depois de algum tempo as costas já estão reclamando.

Mas é inegável a quantidade de recursos em um único aparelho, sem necessidade de cabos de ligação, tudo ali já pronto. Pensei nos cultos nas praças, nos cultos na casa de alguém, em festas de aniversário ou de casamento em que nos pedem “um sonzinho básico” e nas dificuldades em que temos para levar um monte de equipamentos, interligá-los todos e colocar para funcionar. Um aparelho desses, inegavelmente, é “uma mão-na-roda”. Esse tipo de equipamento, sem sacrificar a qualidade, nos permite montar um som rapidamente, em poucos minutos, com pouca coisa para carregar, mantendo uma boa qualidade.

O caso não é o de igrejas, mas observei alguns músicos, desses que tocam em bares à noite, usando cabeçotes. Um microfone, dois ou três instrumentos e o cabeçote ao seu lado.

Cabeçotes x mesas amplificadas

Além dos cabeçotes, existem mesas amplificadas, que integram recursos semelhantes (mesa, efeitos, equalizadores) com amplificador, no próprio corpo da mesa de som. A enorme vantagem é trabalhar com a mesa na posição em que já estamos acostumados, resolvendo assim o desconforto na operação.

Mas os cabeçotes ainda tem uma vantagem. Uma mesa amplificada, para ser levada “prá lá e prá cá”, precisaria de um case (equipamento no case dura muito, fora do case…). Já os cabeçotes já são montados em um “case”! Todos eles tem uma cobertura de madeira (no Alto, é de plástico ABS, bem resistente), que serve também para proteger os botões e controles. Muito bom.

Apaixonei-me. Quero um cabeçote para mim. Fiquei tão entusiasmado com esses cabeçotes que procurei um para comprar para mim, para meu uso pessoal. Esses três modelos estão descartados pelo motivo preço. É muito dinheiro para mim. Tinham que custar bem menos que 1.000 reais. Encontrei dois modelos nacionais:

Staner MPX-220
8 Canais de entrada
3 Bandas de equalização por canal
Controle de efeito por canal (não tem efeito interno, precisa de módulo externo)
Chave PAD (-15 dB) em 4 canais
Circuito Anti-clip
Potência: 220 W RMS em 4  Ohms
Proteção contra curto-circuito e excesso de temperatura
Dimensões (HxLxP): 284 x 460 x 244 mm
Peso: 13 kg

NCA PWM250
Potência máxima total: 250Watts RMS @ 4 Ohms
6 Canais de entrada, sendo 4 Mic P10 e 2 Mic XLR com Phanton 48V (acionamento individual e LED indicador)
6 Line P10
2 canais de entrada Auxiliar com conector RCA (canal A/B), para uso com PC/CD/MD/Videokê
Efeito interno com Reverb, Delay e Echo
Equalizador – 2 bandas (Low, High) por canal
Proteção – Fusível
Dimensões (mm) – (H)50x(L)400x(P)260
Peso – 9K

Comparando esses dois nacionais (preços entre R$ 700,00 e 900,00), descobri que a indústria nacional está a léguas de distância do que estão fazendo pelo mundo afora. E, conhecendo os recursos dos cabeçotes acima, comprar um nacional (mesmo que pela metade do preço) simplesmente não dá. O sonho de um cabeçote fica mais para a frente.

2 Comments on "Cabeçotes, pequenas maravilhas"

  1. Olá, Fernando.
    Excelente post, muito esclarecedor, tirou praticamente todas as minhas dúvidas.

  2. Olá!
    A matéria ficou ótima. Eu também estou cogitando a aquisição de um desses equipamentos, pensando na praticidade. Por enquanto, estou inclinado a comprar o cabeçote da Yamaha.
    Achei o conjunto melhor.

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